Somos Nós: Maria da Luz Bilro

Este intervalo a que todos fomos obrigados a parar, a refletir e para o qual ninguém estava preparado tem sido vivido com alguma angústia, talvez medo,ansiedade em relação ao Futuro.

De repente parou tudo, ficámos confinados, com saídas restritas,projectos adiados ou suspensos, uma sensação tão estranha.

Lutamos contra algo que não se vê,um inimigo invisível que nem sabemos até quando vai estar presente nas nossas vidas e no nosso dia a dia.

De um dia para o outro acordo (do pouco que consigo dormir) à espera de números, quantos já somos infectados,onde é, está mais perto?

O meu trabalho não parou, todos os dias estou num local  onde o inimigo pode pairar e colar-se a cada um de nós, considerado um local de risco.

Dou comigo a julgar os outros, coisa que nem gosto de pensar sequer,se tem máscara,se não tem, que andam a fazer nas filas dos Supermercados, das Mercearias,o que vão fazer ao Centro de Saúde, será que precisam mesmo? como se não fosse necessária essa exposição diária.

Incomoda-me imenso o egoísmo do ser Humano, a falta de responsabilidade perante o próximo.

Afinal abdiquei de ter a presença das minhas filhas para as proteger, abdiquei do meu projecto de voluntariado na ReFood Caldas da Rainha para não colocar os outros em risco, e dava comigo a pensar que afinal há muita gente que não pensa sequer no que anda à nossa volta e no que pode representar andarem na rua como se não fosse nada, sem cuidados.

Sou uma pessoa de afetos, adoro abraços,beijinhos e do nada não os posso ter.

Senti-me só, tão só alguns dias, noites,fins de semana, valeu-me os meus dois Gatos,o Marley e o Prince ,era a eles que dava beijinhos que abraçava até fugirem coitados.

Alguns amigos iam ligando.

O tempo parecia parado,estagnado.

No meu coração de voluntária, arranjei forma de tentar colmatar a falta que sentia da Refood e de tudo o que representa para mim e junto com duas vizinhas colocámos uma Caixa Solidária no nosso Bairro. Eram estes os momentos que nos enchiam o coração, cada dádiva,cada encontro nosso para lá colocar o que podíamos.

Senti que precisava de fazer algo para ajudar quem neste momento está a passar por sérias dificuldades , é assim que me sinto realizada como pessoa, será uma gota de água num oceano grandioso mas é a minha parte,porque juntos somos mais Fortes.

O Lema é "Deixe o que puder,leve o que precisa", movimento anónimo e que respeita a privacidade da necessidade envergonhada que cada vez  mais aumenta,infelizmente.

Todos nós precisamos uns dos outros,

Mas,isto ainda não passou nem acabou.

Aos poucos retoma-se um bocadinho do nosso dia a dia, já tenho a companhia das minhas filhas mas sempre com medo,com a sensação que posso transportar o maldito inimigo para dentro de casa.

Da minha varanda do 3º andar, muitas noites contemplava a Lua, as estrelas, e pensava quando isto irá passar.

Coloquei uma mesa e cadeiras naquele retângulo, e passou a ser a minha "Esplanada", vou jantar fora quase todos os dias, lá tomo o meu pequeno-almoço e começo o dia a agradecer por mais um e a desejar que realmente as nossas vidas voltem ao normal em breve.

Ainda acredito que um dia vamos olhar para este ano de 2020 como o ano da mudança,será?

Entrei nele cheia de esperança que iria ser um Ano de realizações e projectos novos mas todos levámos um grande abanão, afinal precisávamos de parar um tempo.

O Mundo teria muito para mudar mas no Coração.

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